domingo, outubro 17, 2010

Aquecimento Global Pode Exterminar Lagartos

   
Liolaemus lutzae: lagarto da restinga brasileira em risco de extinção
Foto de Luiz Cláudio Marigo

Sem mecanismos internos para aquecer o corpo e regular a temperatura, os lagartos só conseguem correr atrás de comida e do sexo oposto depois de um tempo estirados ao sol. Depois de algumas horas expostos, precisam voltar a um abrigo fresco para não correr o risco de fundir como um motor hiperaquecido. Uma equipe internacional acaba de mostrar, em artigo na Science desta semana, que o aquecimento global já é responsável pela extinção de muitas populações desses animais tão dependentes da temperatura externa. O grupo liderado pelo norte-americano Barry Sinervo, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, prevê que até 2080 as alterações do clima terão varrido da face da terra 20% das espécies de lagartos.

“Estamos discutindo os efeitos do aquecimento global como algo vir mais à frente, sem pensar que ele está acontecendo debaixo das nossas barbas”, comenta o ecólogo Carlos Frederico Duarte Rocha, do Instituto de Biologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Ele foi convidado a fazer parte do estudo por estudar espécies de lagartos brasileiros que vivem em ambientes diversos, com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Junto com colegas de mais 11 países, ele poderia assim ajudar a entender a observação de Sinervo, de que populações inteiras de lagartos estavam desaparecendo na Europa e no México, mesmo em áreas onde o ambiente natural não tinha sido alterado.

O pesquisador californiano encontrou uma explicação provável em estudos de campo com a espécie mexicana Sceloporus serrifer: as populações têm grandes chances de se extinguirem quando temperaturas altas deixam aos lagartos poucas horas disponíveis para comer e se reproduzir, atividades indispensáveis à sobrevivência de qualquer espécie. Nos locais onde populações tinham desaparecido, no México, o tempo de atividade tinha sido reduzido em pelo menos 4 horas. “Em muitos lugares o período ativo ficou tão reduzido que, assim que o lagarto sai, já precisa voltar ao abrigo”, conta Rocha.

Ao reunir dados de 1.216 populações de lagartos, o grupo construiu um modelo que prevê a probabilidade de extinção no mundo todo e concluiu que as temperaturas estão mudando mais depressa do que a capacidade evolutiva de os lagartos se adaptarem. O jeito, em geral, é fugir para áreas mais frescas, montanha acima por exemplo. Mas nem sempre é possível: animais que vivem no topo de montanhas, ou em fragmentos de floresta circundados por áreas desmatadas, ficam sem ter para onde ir.

No Brasil há poucas áreas que foram estudadas ao longo de décadas, por isso é difícil detectar o sumiço de populações, mas Rocha tem um exemplo próximo. De 24 populações estudadas por ele do lagarto Liolaemus lutzae, típico de matas de restinga, 7 já desapareceram. “O problema maior deverá acontecer em espécies típicas de áreas abertas, como o Cerrado, a Caatinga e as restingas”, prevê. Ele explica que os lagartos que vivem em florestas densas têm uma fisiologia adaptada ao menor aporte de luz solar direta e a temperatura de seu corpo varia em função da temperatura do ambiente.

Para o ecólogo da Uerj, o estudo é um alerta para o que pode estar acontecendo com outros animais e até mesmo com as plantas no mundo todo. “Fica claro que é preciso promover desde já uma séria redução nas emissões de gases de efeito estufa.”

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